terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Levítico: chamados para santidade

PARTE II: LEVÍTICO 18 - 27

S de sacrifício. S de sangue. S de sacerdócio. Se essas são as três marcas da primeira parte de Levítico, ainda é possível contemplar as que vêm na segunda parte do livro. S de separação. S de santidade. S de situação. S de sabático. S de símbolos.

Se, por um lado, o início do livro fala sobre vida cerimonial, por outro, o final dele fala sobre vida civil. Se a primeira enfatiza sacrifício no altar, a segunda aponta para santificação na vida. Aproximar-se de Deus não tem a ver apenas com práticas particulares em um lugar específico, mas acontece também com pessoas e relacionamentos que construímos ao longo da estrada. Assim, essa santificação é apresentada com algumas ênfases:

1. Santificação envolve as situações.

O livro levanta as situações mais comuns da vida e que envolviam o povo. A conduta do povo como uma nação que precisava de parâmetros é ressaltada. Há instruções sobre a conduta sexual, relacional e criminal. No que envolvia pessoas, era necessário ter atenção.

Assim, situações típicas do dia-a-dia foram levantadas, apontando o que devia ser combatido e o que precisava ser cultivado, o que necessitava de cuidado e o que poderia ser feito com cautela em consideração ao outro. A pureza passava pelas situações típicas e cotidianas no que tangia relacionamentos humanos.

2. Santificação envolve o sabático.

Mais do que apenas uma preocupação com a conduta ética e moral, o povo foi atentado para a conduta profissional. Não apenas era importante fazer, como também era essencial não fazer. Tão salutar quanto o trabalho era também o descanso. Descanso particular e o descanso público. Descanso dos animais e o descanso da terra. Descanso semanal, bem como o mensal, anual e secular. O sabático estava em tudo aquilo que envolvia o povo.

Assim, o coração do povo era trabalhado. Diante do perigo de muito fazer e se tornar independente, devia relembrar o lugar de Deus no trabalho e cultivarem a dependência. Assim, tinha na semana o dia do sábado. No ano, o mês sagrado com festas. A cada bloco de sete anos, o ano sabático de descanso. E, a cada bloco de sete semanas de anos (ou seja, completados 49 anos), era celebrado o ano Jubileu, no qual havia perdão de dívidas e restauração de terras. O conceito do sábado envolvia descanso, envolvia dependência, envolvia celebração, envolvia perdão.

3. Santificação envolve símbolos.

Mas ainda há mais uma marca neste livro tão singular. Eram os símbolos. Muitos eram os marcos históricos e as festas presentes nesta nação. Os israelitas eram festeiros. Era um povo baladeiro, no sentido mais original da palavra. Mas em toda festa, em cada celebração, havia um propósito por traz que olhava para o coração do homem e para glória de Deus.

As festas comemoradas envolviam, sobretudo, o primeiro e o sétimo mês. O mês em que tudo se inicia, bem como o mês sagrado no qual tudo se contempla. No primeiro mês, havia a Páscoa que celebrava a libertação do Egito. Durante a semana que se seguia, festejava-se a Festa dos Pães Asmos. No meio desta, a Festa das Primícias, dedicando-se a colheita. Cerca de cinqüenta dias depois, no terceiro mês, reuniam-se para a Festa das Semanas ou Pentecoste, na qual existia o sentimento de gratidão pelo alimento que tinham no presente e consagração pelo alimento que teriam no futuro.

No sétimo mês, as festas continuavam. Todo mês, no primeiro dia, as trombetas eram ressoadas. Porém, no sétimo mês, elas eram tocadas com ainda mais força e vigor, tendo neste dia a Festa das Trombetas, anunciando o mês sagrado e festivo. Decorridos dez dias, ocorria o Dia da Expiação, símbolo da purificação de todo povo. Na mesma semana, então, começava a Festa das Cabanas ou Tabernáculo, na qual durante uma semana inteira relembrariam a presença de Deus no meio do seu povo, ao longo de toda peregrinação pelo deserto. Assim, estes símbolos festivos traziam à memória o cuidado de Deus, a importância de sua provisão e amparo.

Diante do cenário cultural e vivencial deste povo, nós aprendemos sobre o processo de santificação na vida. Santificação envolve relacionar-se com pessoas em honra e respeito. Santificação envolve reverenciar Deus em festas. Santificação envolve recordar sua presença e abrigo que nos acompanha. Relacionamentos. Reverência. Recordações. E tudo isso em meio a um cenário de alegria em festividades e fidelidade a um Deus que não deixa seu povo só. Este povo é levado ao longo de todo livro a cultivar este andar santo porque ele, o Senhor, é santo. E isso é marcante em tudo que devem fazer, seja no âmbito familiar e nacional, no trabalho e descanso, nas festas e celebrações.

O contraste com toda instrução para pureza e chamado para santidade é observar o cenário em que nós estamos em pleno século XXI, o qual se fala tanto sobre progressos e avanços para humanidade. Em uma era tão complexa, perdemos a simplicidade da vida. As coisas básicas que envolvem pessoas, os animais e a natureza são atualmente fonte de preocupação pelo nosso descuido e irreverência. As festas não são momentos de celebração de uma alegria perene e duradoura de um povo que deveria se unir como um só, mas são regidas pelo prazer, descartabilidade, superficialidades e ressacas que revelam o vazio interior na manhã seguinte. Alguns de nossos marcos históricos – como, por exemplo, Natal e Páscoa – tornaram-se fonte de renda para uma sociedade de consumo e inescrupulosa que produz produtos e mais produtos sem o cuidado com o planeta, esvaziando o bolso de multidões sem preencher significativamente os tais consumidores com algo existencialmente relevante. E o que falar do sábado? O conceito sabático marcado por reverência é negociado diante de um mundo irreverente que não pára, não perdoa, não depende, não descansa, não celebra. Mal conseguimos lidar com a idéia de descanso semanal, quanto mais mensal, anual ou secular.

A disparidade entre a proposta de Levitico e a nossa prática urbana contemporânea é, no mínimo, digna de reflexão. O que, de fato, as festas e baladas que participamos trazem: euforia momentânea e superficial, ou alegria transformadora? Será que os caminhos escolhidos por nós até aqui estão, de fato, trazendo mais vida para nós, para as pessoas que nos cercam, para nossos filhos que ficarão e para nosso planeta que anuncia mudanças? E os dias “sabáticos” que temos, de fato, preenchem nossa alma, trazendo descanso, paz e serenidade em devoção contemplativa ou são apenas momentos de recuperar o fôlego para voltar o trabalho que urge em ser realizado?

Talvez, em meio aos questionamentos e ponderações, possamos encontrar alguns dos motivos que fazem o nosso mundo ser o que é. A independência pós-moderna impossibilita a manifestação de um Deus que nos convida a depender. A irresponsabilidade urbana em meio a uma economia agressiva corrói um planeta que grita por socorro e entristece o Deus que nos convida à harmonia e ao equilíbrio. A irreverência em nossa vida de momentos e prazeres pontuais e egoístas comprometem nossa jornada de amadurecimento e com um propósito de existência. Nossa geração caminha para ser a conhecida como geração omissa, destituída de líderes e desprovida de sentido. Será que o caminho proposto da santificação em Deus é tão impróprio assim? E nem me refiro aos aspectos literais da lei, mas à essência presente nos princípios por trás dela. Será que eles não nos levarão a um lugar melhor como pessoas e povos espalhados pela Terra?

Pense. Reflita. Aja. É tempo de mudar. E isso pode começar comigo e com você. Começa olhando para Deus e acolhendo sua instrução. Uma instrução que envolve crescimento e maturidade. Uma orientação que almeja a pureza. Uma direção que promove a santificação. Somos chamados para sermos santos. Cabe a cada um de nós atender o chamado. Depende de cada um de nós deixar marcas em um mundo que caminha para o caos e destruição.

Levítico: o Livro do Super-Homem

PARTE I: LEVÍTICO 1 – 17

O mais interessante na Bíblia é o fato de ser um livro de livros, uma história de histórias. Se você já viu um seriado, você sabe do que estou falando. Um seriado tem diversos episódios. Cada episódio tem uma história com começo, meio e fim. No entanto, cada episódio é parte de uma história maior com começo, meio e fim, geralmente formada ao longo de toda temporada. A Bíblia se apresenta da mesma forma: uma grande história composta de pequenas histórias. Histórias que falam sobre dor. Histórias que falam sobre sofrimento. Histórias que falam sobre amor. Histórias que falam sobre redenção. Histórias dentro de uma grande história. A grande história do Deus que deseja se relacionar conosco. A grande história do Deus que se preocupa com o que existe dentro de nós. A grande história do Deus que pagou esse alto preço para se aproximar de nós.

O livro de Levítico é um desses livros que está dentro desta grande história. E, nesta pequena história, há uma letra marcante: a letra S. Um livro que fala sobre sacrifício. Um livro sobre sangue. Um livro sobre sacerdócio. O livro do S.

Na primeira parte do livro, a ênfase é clara: para se aproximar de Deus, é necessário sacrifício. E este sacrifício é apresentado a partir de dois parâmetros.

1. Sacrifício envolve sangue

Alguém precisa assumir o dano. O pecado entrou no mundo e trouxe a separação. Trouxe a morte. Trouxe o sangue. E, para se achegar a Deus, algum sangue precisa ser derramado. Assim, o livro começa mostrando os diferentes sacrifícios que envolvem sangue. E adivinha para quem sobrou. Sobrou para os animais. Sobrou para o bode, o cordeiro, o novilho, as aves e por aí vai. Para que a conexão com Deus seja mantida, sangue precisa ser derramado.

Para cada prática, um tipo de sacrifício é requerido. Se é em atitude de dedicação da vida, a oferta é o holocausto. Se é motivada pela dedicação da colheita ou da produção, a oferta é de manjares. Se é fruto de gratidão, a oferta é de paz. Se é pelo dano que deve ser carregado, é a oferta pelo pecado. Se é pelo dano que deve ser quitado, é a oferta pela culpa. Mas, todos eles tinham algo em comum além do sangue. Eles precisavam dar do que tinham.

2. Sacrifício envolve sacerdócio

Esses sacrifícios citados, no entanto, não seriam oferecidos por qualquer um. Algumas pessoas foram separadas. Algumas pessoas foram dedicadas. Essas pessoas eram os levitas. Eles eram os encarregados desta responsabilidade de conduzir o sacrifício. Assim, esta parte inicial do livro descreve como o sacrifício deve acontecer, o que o sacerdote deve fazer, o que precisa evitar, sempre apontando para um contexto de pureza, reverência, honra e respeito.

Para isso, algumas pessoas específicas tornam-se mediadores entre o povo e Deus. Uma tribo com uma tarefa especial foi escolhida para o serviço. E que serviço desafiador! Imagine a responsabilidade! Imagine o privilégio!

O primeiro bloco de Levítico mostra essa importância do sacrifício. Um povo chamado para ser santo precisa conectar-se com Deus. E essa conexão vem através de sacrifícios. Essa conexão é estabelecida através do preço pago por alguém. Essa conexão precisa ser feita por alguém e através de alguém. Neste sentido, sacrifício envolve sangue. Sacrifício envolve sacerdócio.

Nesta primeira parte do livro, é interessante notar algo extremamente singular que é descrito neste contexto de sangue e sacerdócio. É o Dia da Expiação, Yom Kippur (capítulo 16). Nesse dia, um sacrifício específico era realizado. Era o sacrifício oferecido por toda nação. O sumo sacerdote – o sacerdote acima de todos – entrava num lugar especial chamado “Santo dos Santos”, uma vez por ano apenas, e ali, oferecia um sacrifício por toda nação. Depois de oferecer o sacrifício por si próprio, de modo a torná-lo puro, o sacerdote teria diante de si dois bodes que seriam sacrificados. Cada bode simbolizava algo particular. Um deles seria sacrificado pelo pecado do povo. O outro, o bode expiatório, seria enviado ao deserto, simbolizando a saída do pecado do meio do povo.

Mas por que isso é tão interessante? O que tudo isso tem a ver conosco? É singular contemplar o quão precioso tudo isso é para nós. A primeira delas é que há um alto preço. Imagine você, com seu último bode, ainda novinho, e que precisa ser sacrificado. A pergunta que pode surgir é: como vou me alimentar depois? Sacrificar um animal significava sacrificar a própria fonte de renda. Significava sacrificar aquilo que poderia alimentar a família. E isso nos leva a uma nova perspectiva. De repente, pecado torna-se algo sério. Torna-se algo que causa um grande dano. Através da doação daquilo que temos de valor, podemos compreender um pouco o quanto machucamos Deus. E o interessante é notar que os sacrifícios não deviam ser oferecidos de qualquer jeito e nem com qualquer animal. Deveriam ser oferecidos da melhor forma e com o melhor animal que se possuía. Deus pegou pesado nessa, hein? Deus partia daquilo que poderia ser o mais importante para o povo e assim ensinava sobre o custo do pecado, o dano do erro, o valor do sacrifício. Você percebe o que significava pecar para aquele povo?

Agora imagine a situação contextualizada para os dias de hoje. Imagine que você tivesse que sacrificar algo que você possui em sua casa cada vez que pecasse. Um par de meias. Um par de sapatos. Mas não qualquer par de meias ou sapatos, mas os recém adquiridos nas últimas compras. Um conjunto de roupas novinhas. É... Aquela que você nem usou ainda. Se o pecado fosse “grande”, seria a televisão. Depois, a geladeira. Em seguida, o fogão. Ou o salário do mês. Imagine se o mesmo fosse exigido de nós hoje. Se a cada pecado, tivéssemos que oferecer algo que possuímos. Fico imaginando o que será que ainda teríamos em casa ou se ainda teríamos uma casa.

Com a prática do sacrifício, o povo era levado a cultivar em sua mente e coração o custo que envolvia. E esse custo era alto. E aqui que tudo se torna ainda mais interessante. Sabe por quê? Porque, graças a Deus, você não precisa abrir mão do que tem para pagar o dano causado pelo pecado. O preço já foi pago.

O Super-Homem de Levítico

Você não precisa vender seu apartamento. Você não deve dar nenhum dinheiro para uma igreja para ter terreno no céu. Você não tem que financiar no banco sua dívida com Deus. Jesus quitou todas as dívidas. Ele pagou o preço. Assumiu todo dano. O bode agradece. O cordeiro regozija. E eu e você nos aliviamos.

No entanto, Deus deseja que saibamos que o custo foi alto. Na verdade, altíssimo. Assumir uma dívida tão grande exigiu que Deus entrasse na história, desse seu único filho e que ele carregasse toda culpa e todo pecado naquela cruz. E Jesus, o Cristo, pagou de modo definitivo, de uma vez por todas. Não havia outra pessoa que pudesse fazer isso e ele fez. O Messias dedicou sua vida, oferecendo-se como o holocausto definitivo. Serviu a Deus dedicando tudo o que tinha, tornando-se a oferta de manjar plena. Fez isso em gratidão, revelando a oferta de comunhão que nos trouxe a paz. Assumiu o dano carregando-o e sendo a oferta pelo pecado. Quitou a dívida, fazendo-se a oferta pela culpa que nunca mais precisará ser oferecida. E mais do que isso: naquela páscoa de sua morte, celebrou o Yom Kippur final. Foi o bode oferecido pela nação e o bode expiatório que retirou do meio do povo todo pecado, morrendo fora da cidade.

Depois de tudo isso, você acha que é o fim. Mas ainda não é. Eu falei apenas do que ele fez através de seu sangue. Ele foi mais que isso. Ele não foi o sacrifício que envolveu apenas sangue, mas o sacrifício que envolveu o sacerdócio. Não foi apenas o sacrifício, mas também quem realizou o sacrifício. Foi a oferta e o ofertante. Foi o cordeiro e o sacerdote. Foi o sangue derramado e o executor de tal tarefa. Ele mesmo se deu. Ele mesmo se ofereceu. Jesus não terceirizou o trabalho, mas envolveu-se em todo processo. Ele mesmo se colocou em nosso lugar, fazendo tudo o que precisa ser feito. Foi por isso que pôde dizer: “Está consumado”.

Minha reação é olhar para Levítico e para resposta trazida no Novo Testamento que podemos ler no livro de Hebreus - o qual mostra Jesus como Sacerdote Supremo e Sacrifício Final - e dizer que Levítico é o livro do S. S de sacrifício. S de sangue. S de sacerdócio. S de Super-Homem. Super-Homem porque ele fez o que nenhum homem conseguiria fazer. Ele tinha todo poder, mas escolheu o amor. Ele podia vencer pela força que destruiria vidas, mas venceu pela entrega que reconstruiu almas. Calou as multidões que zombavam, batiam e o humilhavam ao permanecer em silêncio. Venceu a morte ao ir ao seu encontro e ressuscitar no amanhecer do terceiro dia. E você percebe o quanto isso custou para ele? Você percebe o quanto ele nos amou?

O problema é que, diante de tudo isso, o pecado ainda continua sendo banalizado. O pecado não é levado a sério. A transgressão não é vista como prejudicial. A falta de pureza não é algo digno de atenção. Pecar faz parte. Pessoas se dizem cristãs, mas continuam a lidar com o pecado de modo indiferente. Não olham para o custo que ele traz. Não têm consciência do dano que causa. Não se esforçam para evitá-lo. Não lutam para superá-lo. Não perseveram no Senhor. Antes, fecham os olhos para o quanto é destrutivo. Pecado hoje é uma palavra em desuso. Numa sociedade relativista, o pecado se torna relativo. Aliás, o que é pecado em uma geração na qual somos deuses de nós mesmos? A perda de parâmetros leva-nos a indiferença com relação ao pecado. Culmina na separação de Deus, na irreverência diante do Todo-Poderoso, na desonra do Pai Eterno, na insubmissão ao Santo Senhor. Não é para menos que nossas cidades estão como estão. Deus está deixado de lado. Seu amor não é reconhecido. Sua vida não faz diferença. É necessário repensar. Levítico nos leva a isso.

Assim, a pequena história deste livro aponta para a grande história de Jesus. Do começo ao fim, a Bíblia tem a ver com Jesus. Em Levítico, um alto preço era necessário ser pago para que o ser humano fosse aproximado de Deus. Séculos depois, Jesus pagou esse preço definitivamente. Será que isso não será suficiente para constranger você e eu para amá-lo e dedicarmos nossa vida a ele? Será que não vale a pena viver por alguém que fez tanto assim por nós?

Levítico: um livro esquecido

INTRODUÇÃO

Se alguém nos falasse para tirarmos um livro do Pentateuco¹ de nossas leituras devocionais, é bem possível que escolhêssemos Levítico. Afinal de contas, o que um livro com um monte de leis e regras poderia nos ensinar diante daquilo que nos envolve em pleno século XXI?

No entanto, apesar de uma visão inicial aparentemente distante e sem propósito diante das necessidades de um mundo urbano e pós-moderno, é um livro que tem uma mensagem atual que o nosso coração precisa. Levítico vem depois do livro do Êxodo e a ligação entre eles é algo digno de atenção.

Em Êxodo, o povo passa seu primeiro ano no deserto, após serem libertos do Egito. Até aqui, caminharam do Egito ao Monte Sinai. Agora, em Levítico, estão diante do Monte Sinai, ouvindo as orientações para a peregrinação no deserto. Até a saída do Egito, era um povo sem leis, sem orientação, sem instruções para a vida em sociedade. Levítico vem cumprir esse propósito. É o livro que procura dar direção, estabelecendo limites, conduzindo os israelitas em princípios e valores, orientando na vida civil e cerimonial, guiando na vida familiar e social, tendo sempre em mente a busca pela santidade de modo a manifestar a glória a Deus.

Assim, enquanto Êxodo é um livro de Deus para o ser humano, Levítico é um livro do ser humano para Deus. Enquanto o primeiro revela o poder e presença de Deus, o segundo aponta para a resposta humana diante de tais manifestações. Enquanto o primeiro conta o início de uma jornada de salvação, o segundo guia no caminho da santificação. Enquanto o primeiro apresenta um grande ato de livramento, o segundo revela um longo processo de crescimento.


Talvez um dos aspectos mais importantes do livro seja o fato de mostrar que há um alto preço para se aproximar de Deus. Todo livro é envolvido por essa realidade. E isso porque o ser humano decidiu, num passado distante, desobedecê-lo, não o ouvindo, mas caminhando segundo seu próprio coração. Assim, o pecado criou esse abismo entre Deus e o homem, entre os propósitos eternos do Todo-Poderoso e a vontade passageira do homem decadente, entre o Deus Infinito e o homem limitado. O pecado trouxe a separação. O pecado distanciou Criador e criatura. Dentro dessa perspectiva do pecado e do que gerou, Levítico torna-se um relato que fala sobre o alto preço que custaria para os israelitas cultivarem essa conexão com Deus.

Nesse sentido, será que este livro é tão irrelevante para nós? Assim como aquele povo, será que também não precisamos de instrução e orientação para crescer e amadurecer? Verdade é que também nos afastamos de Deus. Escolhemos nossos caminhos. Definimos nossa agenda. Priorizamos o que achamos importante. Não temos um norteador a não ser nosso coração, nossos desejos, nossas vontades, nossa busca pessoal por felicidade. A conseqüência de tudo isso é a falta de referência e propósito, além de um grande vazio interior.

O livro traz à consciência humana a importância de se reaproximar. Fala sobre a necessidade de parâmetros na vida. O Senhor quer se relacionar conosco. Ele deseja ser nosso amigo nesta jornada. Ele anseia nos conceder um propósito grandioso para a vida. Mas para isso existe um preço. O preço de abrir mão das vontades. O preço de abrir mão de nossa agenda. O preço de que nossos desejos morram para que os dele nasçam. O preço de ouvir a voz do Deus Eterno. O preço de entender que não somos apenas salvos, mas também chamados para sermos santos. Porém, a ação não começa em nós, mas é uma reação ao que ele fez e faz por nós. Não é fruto de uma vida motivada por regras e leis, mas uma resposta de amor em obediência ao Deus que nos amou primeiro. Não é uma prática em busca de reconhecimento, mas uma disposição que revela o valor que ele possui para nós.

Ao se aproximar de Levítico, tenha em mente isso. Não é meramente um livro sobre leis e regras, mas um livro sobre amor e orientação. Não é um livro sobre rituais sem sentido na vida, mas sobre práticas que cultivam o coração. Não é um livro sobre atitudes sem sentido, mas sobre o caminho que leva à pureza e santidade. É o livro que expressa o preço que se custa para estar em comunhão com Deus. É um livro sobre reverência, respeito, dignidade, honra e temor. Certamente são palavras em falta hoje. Mas que tal se aproximar desse livro sob este olhar?

¹ Pentateuco é o conjunto dos cinco livros iniciais da Bíblia, conhecidos também como a Lei ou Torá.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Êxodo: uma jornada marcada pela presença de Deus

PARTE III: ÊXODO 25 - 40
Uma reflexão sobre dedicação

Talvez uma forma de resumir o livro do Êxodo seja a que segue: Êxodo 1 a 18 revela o poder do Deus que guarda seu povo e intervém a seu favor. A reação humana envolve dependência ao longo da vida. Êxodo 19 a 24 revela os princípios do Deus que guia seu povo e o instrui. A reação humana envolve direção ao longo da vida. Êxodo 25 a 40 conclui, apontando para a presença de Deus que manifesta sua glória ao seu povo e o inspira. A reação humana envolve a dedicação ao longo da vida. Um não existe sem o outro e tudo culmina em seu final.

Todo o livro aponta para o contexto do Tabernáculo. O povo foi liberto para glorificar a Deus e isso aconteceria envolvendo a prática no Tabernáculo. Deus o descreve a Moisés. Moisés designa líderes e tarefas para construí-lo. O povo dedica o que tem. Mas... nem tudo foi tão simples assim quanto possa parecer. Enquanto Moisés está com Deus conversando sobre o Tabernáculo, o povo está com Arão conversando sobre um bezerro. Enquanto Moisés se maravilha com a excelência indescritível da habitação de Deus, o povo se perde na exuberância idólatra de uma imagem de ouro. Moisés desce do monte, vê a cena insana e quebra as tábuas da lei atirando-as ao chão. Talvez devesse quebrá-las na cabeça de Arão.

Mas será que é muito diferente conosco? Ao invés de esperarmos para fazer o que Deus quer, precipitamo-nos na realização de nossos projetos. Deus é esquecido e construímos nossos próprios deuses. Não temos paciência e queremos logo uma resposta. Escolhemos o que faremos, ao invés de esperar para saber o que devemos fazer. Assim, construímos nossos bezerros e perdemos os projetos de Deus. Ofertamos o que temos, mas às causas erradas. Damos o que possuímos, mas com as motivações corrompidas. Fazemos o que não podemos, desperdiçamos tempo e dinheiro com o que não devemos. E assim, Deus perde seu espaço e sua glória se ausenta.

O povo fez o que não podia, ofertou o que não devia. Então, Deus disse que não iria com o povo. Moisés intercede pelo povo. Ali ele pediu: “Se a tua presença não for conosco, não nos retire deste lugar”. Precisamos aprender a dizer o mesmo: “Deus, eu errei. Falhei contigo. Fiz o que não devia. Escutei quem não podia. Utilizei o que tinha com o que não valia a pena. Preciso de ti. Vá comigo. Se assim não for, não me mandes embora. Quero sair daqui apenas se for contigo.” A reação de Deus é atender o desejo sincero de nosso coração.

Ele fez assim com Moisés e o povo. Diante da nova possibilidade, agora o povo muda de atitude. E mudou radicalmente, dedicando tudo o que tinha para a construção do Tabernáculo. Chegou ao ponto de tamanha dedicação que os líderes pediram para que parassem de ofertar. Já parou para pensar na cena? Um povo que antes estava perdido em seus desejos e atraído por um deus que eles mesmos construíram, agora se arrepende e dedica tudo o que possui para Deus a ponto de Moisés dizer: “Chega! Temos o suficiente!”. É o sonho de toda comunidade cristã. É o sonho para todo o mundo: pessoas que se dedicam total e fielmente pela causa mais nobre que existe. É a realidade de dar sem limites, ajudando a que o projeto de Deus se realize.

O quadro final do livro é claro: onde se tem dedicação total e disposição completa, Deus se faz presente. Sua glória se manifesta. Pessoas são abençoadas. O lugar é preenchido com a plenitude do Senhor. A mensagem do livro do Êxodo ainda nos ensina hoje: Ao dependermos de Deus, sendo guardados pelo seu poder e ao sermos direcionados pelos seus princípios, dedicaremos tudo o que temos e a presença de Deus se manifestará.

O mundo precisa de Deus. E se Deus não tem se manifestado tanto no mundo como poderia é porque a igreja não tem se dedicado a Deus como deveria. Antes, tem construído seus próprios bezerros. Tem feito seus próprios deuses. Não tem sido levado pelo projeto de Deus, mas pelos próprios projetos. Tornam-se igrejas que pedem dinheiro para seus deuses e para se enriquecerem, ao invés de construírem o reino de Deus de amor, justiça e retidão, atendendo seu chamado. Servos que se tornam senhores, egoístas, auto-centrados, manipuladores de multidão. Um povo egoísta, interesseiro, que busca sua segurança e barganhas com Deus, ao invés da missão que envolve doação e serviço. Onde não há dependência do poder dos céus, não há Deus. Onde não há direção a partir dos princípios do Senhor, não há Deus. Onde não há dedicação ao Rei dos reis, não há manifestação da presença de Deus.

É tempo de pensar. É tempo de avaliar. É tempo de mudar. O povo de Israel mudou. Trocou o bezerro pelo Tabernáculo, a luz reluzente do ouro pela luz infinita da glória de Deus. Hoje é possível fazermos o mesmo. O mundo precisa da glória de Deus. O mundo precisa de Jesus, aquele que é o Tabernáculo de Deus que habitou entre nós e manifestou a glória do Pai. O mundo precisa da igreja, lugar onde o Espírito de Deus habita e que tem a missão de se dedicar a fim de revelar essa mesma glória do Pai.

Somos chamados para depender de Deus. Somos chamados para termos sua direção. Somos chamados para nos dedicarmos. Somos chamados para glorificar. Chegou a hora. Vamos atender o chamado?

Êxodo: uma jornada marcada pelos princípios de Deus

PARTE II: ÊXODO 19 - 24
Uma reflexão sobre direção

Deus tem todo poder. Ele salvou um bebê hebreu perdido num rio, capacitou um jovem egípcio promissor que se tornou um fugitivo, chamou um peregrino no deserto que conversou com Ele através de uma planta, libertou milhares da escravidão no Egito, fortaleceu multidões ao dar alimento e água em terra árida. Esse é o Deus de todo poder. É o Deus maior que pragas. É o Deus maior que os homens. É o Deus maior que reis e faraós. É o Deus maior que os mares. E esse Deus de todo poder não é somente o Deus que faz, como também o Deus que fala. Depois de mostrar seu poder, o Senhor revela seus princípios. Ele não apenas concede vitória, como também revela sua vontade.

Quando o Todo-Poderoso fala, o mínimo que se pode fazer é escutá-lo. Afinal de contas, se o Deus Todo-Poderoso utiliza seu tempo para falar com seu povo, certamente é algo para se pensar e dar atenção. E Ele o faz para que tudo vá bem. Uma comunidade sem limites, sem orientação, não precisa apenas ser guardada do mal, mas também guiada na vida. E a Sua palavra determina princípios, concede direção, compartilha sabedoria.

1. Ao longo da jornada, precisamos de princípios que valorizem Deus.

Você já parou para pensar no sentido que há naquilo que buscamos? Para que corremos tanto atrás do dinheiro ou da promoção? E o que dizer do PhD almejado? Ou da busca por status e reconhecimento das pessoas? Que sentido pode existir em tudo isso sem Deus?

Ele é quem diz: “Eu sou o Senhor”. Sem Ele, não há razão de caminhar. Sem Ele, não há propósito para se viver. O que temos e conquistamos torna-se vazio e sem sentido. O que sonhamos e projetamos não sacia a alma. Sem sua voz, perdemos o foco. Sem sua orientação, caminhamos sem propósito. Sem o seu guiar, vivemos sem direção.

O mundo hoje está assim: sem a voz de Deus. Ao invés de sua voz, escolhemos a voz do próprio coração. Ao invés da vontade do Pai, cultivamos os desejos da nossa própria vida. O lugar de Deus foi tomado pelo ser humano. Não existem mais princípios, mas meras sugestões. Não há mais ordens, mas apenas opções. Estamos desgovernados. Escutamos nosso próprio coração ao invés de ouvir a voz dos céus. Atendemos nossas próprias ambições ao invés de nos submetermos ao Senhor dos senhores. Será que não é aqui que começa o caos que vivemos?

Para piorar a situação, a complexidade e diversidade de vozes que existem atualmente apenas tornam o desafio ainda maior. São as vozes distorcidas nos valores, incoerentes no lar, relativizadas nas amizades, sedutoras na mídia, atraentes na internet, injustas na sociedade, gananciosas nas corporações, egoístas na vida. E o pior é que continuamos a ouví-las e atendê-las.

E se não bastasse, um agravante a mais: ocupamos nosso tempo com barulho. O silêncio não tem mais lugar na realidade atual. Ao entrar no carro, ligamos o rádio. Ao chegarmos em casa, a televisão tem sua vez. No quarto, o computador. Sempre temos algo a fazer, sempre temos algo para quebrar o silêncio. Não podemos perder tempo. Não podemos ficar parados. Não escutamos Deus porque não escutamos o anseio que há no mais íntimo do nosso coração. Será que é tão difícil assim perceber a necessidade que temos d’Ele?

Necessitamos silenciar a alma. Precisamos abaixar o volume da vida. Devemos minimizar os ruídos do mundo. O que há dentro de você? Com tantas vozes que relativizam, será que não passamos da hora de olhar para o Deus Absoluto?

2. Ao longo da jornada, precisamos de princípios que valorizem pessoas.

A marca urbana contemporânea envolve não apenas um vazio existencial de propósito e significado, como também de amor e inclusão. Pessoas deixaram de ser pessoas para se tornarem utilitários. São meios para se conseguir o que se quer. Um jeito de ter mais um contato, conseguir uma promoção, sentir-se melhor, ser mais feliz. E se as pessoas comprometem nossas buscas, partimos para outros relacionamentos.

Assim, se alguém falha, descartamos. Se alguém fracassa, ignoramos. Se alguém decepciona, rompemos. Desejamos o prazer, mas não o amor. Buscamos a satisfação, mas não a doação. Ansiamos pela aceitação, mas oferecemos a rejeição. Vivemos a tentativa de colher o bem, mas semeamos o mal. A incoerência relacional persiste.

Um namoro existe enquanto existe prazer. A crise num casamento significa divórcio à vista. A amizade persiste enquanto se tem interesses em jogo. A família tornou-se projeto numa agenda ao invés de investimento de vida. Compramos presentes para conquistarmos um filho, mas não dedicamos tempo para estarmos com ele. Enchemos a casa de bens ao invés de enchê-la de amor. O lar passou de local de refúgio para lugar de distância.

O cenário final? Superficialidade. Máscaras. Falsidade. Descartabilidade. Insegurança. Incerteza. Medo. Isolamento. Solidão. É possível estarmos no shopping entre multidões e nos sentirmos vazios e solitários. É possível estarmos em casa com toda família, mas com cada um na sua, sem saber o que se passa no coração do outro. Ou ainda no trabalho e não saber nada além do nome da pessoa com quem trabalhamos.

Deus mostra a importância de princípios que envolvem pessoas. Considerá-las, amá-las e abençoá-las envolve aceitação, inclusão, doação, esforço e dedicação. E o benefício será de todos. Com tantas vozes que individualizam, será que insistiremos em não valorizar pessoas? Que tal amá-las?

Os princípios de Deus envolvem amá-lo. Os princípios de Deus envolvem amar pessoas. Que tal simplificarmos a vida? Que tal escutarmos a voz que mais importa e que saciará todos os reais desejos do nosso coração?

Êxodo: uma jornada marcada pelo poder de Deus

PARTE I: ÊXODO 1 - 18
Uma reflexão sobre dependência

Sim, é verdade. O improvável aconteceu. Talvez o mais preciso fosse dizer o impossível. Não havia como evitar. Não tinha outra opção. Não havia saída. Mas ainda assim...

Um povo egípcio poderoso. Um povo hebraico numeroso. Uma ameaça ao reino. A ordem foi estabelecida: se nascer uma criança e for menino hebreu, deve morrer! Meninas estão livres. Se você é mãe, deve imaginar a dor. Imagine a expectativa no nascimento por saber o sexo. Um ultrassom anteciparia a novidade. Talvez ajudasse a planejar a fuga da criança. Mas não foi assim. Meninos sem esperança. Meninos que mal viram a luz e se dirigiam à morte. As parteiras tentaram obedecer a ordem, porém, não conseguiram. Inventaram uma desculpa. Era muita crueldade. E os meninos foram salvos. Pelo menos por enquanto.

Não durou muito e uma nova ordem surge: que os meninos que nascerem sejam jogados no rio Nilo! Qual destino seria pior: ver o filho morrer num ato desumano ou vê-lo sofrer num rio antes de perecer? Qual você escolheria? O coração apertou, mas foi assim para todos. Ou deveríamos dizer, quase todos.

Um bebê hebreu teve um caminho, no mínimo, interessante. Depois de três meses de vida, seu destino também foi o Nilo. A morte era só questão de tempo. Porém, de alguma forma, o inesperado ocorreu: o pequeno hebreu navegou pelo rio. Balançou, mas não caiu. Antes, chegou aos pés de uma princesa. Ela o olhou. E o amou. E o salvou. Deu para uma hebréia cuidar dele até seu crescimento. E adivinha quem foi a responsável pela criação do menino? A própria mãe do bebê! Sim, a própria mãe cuidou de seu filho e o acompanhou durante a infância. E mais: ganhou um salário para isso. Deus, às vezes, parece cômico.
Você já se sentiu assim? Tudo parecia contrário. O caos estava à sua volta. Alcançou sua casa. Tirou sua esperança, Sugou suas energias. Limitou as possibilidades. Retirou suas forças. O sofrimento o cercou. Você se sentiu sufocado. Mas, no meio da tempestade, Deus fez algo extraordinário. E ainda faz.

Você olha para a história do pequeno bebê e pensa que a história acabou. Mas ela mal começou. O pequeno menino tornou-se homem. Adquiriu educação dupla: hebraica e egípcia. Tornou-se um jovem promissor. Carreira garantida. Futuro de sucesso. Até que tudo mudou subitamente. Sua história, mais uma vez, tomou novo rumo. De bebê sem futuro a jovem rico que agora se transforma em assassino ao proteger seu próprio povo. Foge. E sua vida no deserto apenas se inicia.

No deserto, peregrinou. Sofreu. Casou. E o tempo passou. Quando menos esperava, encontrou-se com Deus. Foi numa sarça. Uma planta que pegava fogo, mas não se consumia. Eu sei, eu sei. Pouco provável. Menos provável ainda era essa planta falar e esse Moisés - assassino, limitado, pobre e sem eloqüência – retornar ao Egito e livrar um povo escravizado por quatrocentos e trinta anos por um grande império. Passados alguns pequenos detalhes, Moisés tornou-se este homem: libertador e guia de milhares pelo deserto. E, mais uma vez, o improvável aconteceu. A comicidade de Deus parece não ter fim.

Mas voltemos aos pequenos detalhes. Quais são eles na história? Dez pragas, um mar e alimento no meio do nada. As dez pragas alcançaram um poderoso povo com deuses. Em cada praga, um deus vencido. E, na última delas, a expressão máxima de um deus específico: o próprio homem. Deus mostra que é maior do que os deuses. Deus mostra que é maior do que os homens. Se não é o bastante, pulemos algum tempo para o futuro e olhemos para o mar. Ali, de um lado, o mar; do outro, o exército mais poderoso da época; no meio, um povo sem saída. Qual seria sua reação? Você acreditaria naquele Deus que livrou do Egito? O fim da história você sabe. Povo salvo e exército engolido pelo mar. Deus é maior do que mares. Deus é maior do que exércitos. Mas ainda tem mais: o que comer e beber no deserto? Mas nada que Deus não possa resolver. Ele provê pequenas aves, pães e água, os quais sustentaram todos no deserto. Nas três situações, uma mesma realidade: provisão. Provisão que liberta, provisão que julga, provisão que sustenta, provisão que manifesta seu poder.

Diante de tudo isso, pense um pouco e escolha o ato é mais absurdo: um bebê salvo em um grande rio e cuidado pela própria mãe que ganha um salário da princesa? Um jovem com carreira promissora e futuro garantido que perde tudo ao se tornar assassino e recomeça no deserto? Talvez a conversa com uma planta que não se queima que lhe concede uma missão para a vida? Ou ainda o fato de um homem de péssima oratória negociar com o homem mais poderoso da terra o término de uma escravidão de séculos? Você pode ainda escolher um povo que derrota o exército mais poderoso da época diante de um mar, sem nada fazer a não ser reclamar? E o que falar da comida e água no meio do deserto?

A mensagem é clara: Deus é Deus. Seu poder é sem igual. Mesmo que não tenhamos as respostas, Ele tem. Mesmo que não saibamos o que fazer, Ele sabe. É o GRANDE EU SOU, maior que tudo e todos. É o Superlativo de toda grandeza. É a Excelência de toda obra. É Imutável em sua natureza. É Incomparável em sua majestade. É Indescritível em seus feitos. É a Suprema Sabedoria que transcende o conhecimento humano. Ele é o Rei dos reis. Não existe nada pequeno demais que fuja do seu alcance. Não há nada grande demais que supere seu poder. Ele é o Todo-Poderoso, o Princípio e o Fim, a razão de tudo que há.

Eu sei: muitas coisas não fazem sentido. E poderia fazer sentido à mente humana finita a realidade do Deus Infinito? Talvez, no caso dessa história, nada parece ter sentido. E é aí que vemos a diferença entre o homem e Deus, entre conhecimento humano e a Sabedoria de Deus. Vai além de nós. Muito além.

Em meio a tudo isso, aprenda a lição: não seja independente. Dependa d’Ele. Ele tem o caminho. Ele tem as respostas. Você não precisa resolver tudo sozinho. Renda-se à vontade d’Ele, seja ela qual for. Seja envolvido pelo seu poder. Seja renovado pela esperança em meio ao caos. Seja guiado pelo Deus que não nos desampara em meio ao deserto. Aprenda a depender.