terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Levítico: chamados para santidade

PARTE II: LEVÍTICO 18 - 27

S de sacrifício. S de sangue. S de sacerdócio. Se essas são as três marcas da primeira parte de Levítico, ainda é possível contemplar as que vêm na segunda parte do livro. S de separação. S de santidade. S de situação. S de sabático. S de símbolos.

Se, por um lado, o início do livro fala sobre vida cerimonial, por outro, o final dele fala sobre vida civil. Se a primeira enfatiza sacrifício no altar, a segunda aponta para santificação na vida. Aproximar-se de Deus não tem a ver apenas com práticas particulares em um lugar específico, mas acontece também com pessoas e relacionamentos que construímos ao longo da estrada. Assim, essa santificação é apresentada com algumas ênfases:

1. Santificação envolve as situações.

O livro levanta as situações mais comuns da vida e que envolviam o povo. A conduta do povo como uma nação que precisava de parâmetros é ressaltada. Há instruções sobre a conduta sexual, relacional e criminal. No que envolvia pessoas, era necessário ter atenção.

Assim, situações típicas do dia-a-dia foram levantadas, apontando o que devia ser combatido e o que precisava ser cultivado, o que necessitava de cuidado e o que poderia ser feito com cautela em consideração ao outro. A pureza passava pelas situações típicas e cotidianas no que tangia relacionamentos humanos.

2. Santificação envolve o sabático.

Mais do que apenas uma preocupação com a conduta ética e moral, o povo foi atentado para a conduta profissional. Não apenas era importante fazer, como também era essencial não fazer. Tão salutar quanto o trabalho era também o descanso. Descanso particular e o descanso público. Descanso dos animais e o descanso da terra. Descanso semanal, bem como o mensal, anual e secular. O sabático estava em tudo aquilo que envolvia o povo.

Assim, o coração do povo era trabalhado. Diante do perigo de muito fazer e se tornar independente, devia relembrar o lugar de Deus no trabalho e cultivarem a dependência. Assim, tinha na semana o dia do sábado. No ano, o mês sagrado com festas. A cada bloco de sete anos, o ano sabático de descanso. E, a cada bloco de sete semanas de anos (ou seja, completados 49 anos), era celebrado o ano Jubileu, no qual havia perdão de dívidas e restauração de terras. O conceito do sábado envolvia descanso, envolvia dependência, envolvia celebração, envolvia perdão.

3. Santificação envolve símbolos.

Mas ainda há mais uma marca neste livro tão singular. Eram os símbolos. Muitos eram os marcos históricos e as festas presentes nesta nação. Os israelitas eram festeiros. Era um povo baladeiro, no sentido mais original da palavra. Mas em toda festa, em cada celebração, havia um propósito por traz que olhava para o coração do homem e para glória de Deus.

As festas comemoradas envolviam, sobretudo, o primeiro e o sétimo mês. O mês em que tudo se inicia, bem como o mês sagrado no qual tudo se contempla. No primeiro mês, havia a Páscoa que celebrava a libertação do Egito. Durante a semana que se seguia, festejava-se a Festa dos Pães Asmos. No meio desta, a Festa das Primícias, dedicando-se a colheita. Cerca de cinqüenta dias depois, no terceiro mês, reuniam-se para a Festa das Semanas ou Pentecoste, na qual existia o sentimento de gratidão pelo alimento que tinham no presente e consagração pelo alimento que teriam no futuro.

No sétimo mês, as festas continuavam. Todo mês, no primeiro dia, as trombetas eram ressoadas. Porém, no sétimo mês, elas eram tocadas com ainda mais força e vigor, tendo neste dia a Festa das Trombetas, anunciando o mês sagrado e festivo. Decorridos dez dias, ocorria o Dia da Expiação, símbolo da purificação de todo povo. Na mesma semana, então, começava a Festa das Cabanas ou Tabernáculo, na qual durante uma semana inteira relembrariam a presença de Deus no meio do seu povo, ao longo de toda peregrinação pelo deserto. Assim, estes símbolos festivos traziam à memória o cuidado de Deus, a importância de sua provisão e amparo.

Diante do cenário cultural e vivencial deste povo, nós aprendemos sobre o processo de santificação na vida. Santificação envolve relacionar-se com pessoas em honra e respeito. Santificação envolve reverenciar Deus em festas. Santificação envolve recordar sua presença e abrigo que nos acompanha. Relacionamentos. Reverência. Recordações. E tudo isso em meio a um cenário de alegria em festividades e fidelidade a um Deus que não deixa seu povo só. Este povo é levado ao longo de todo livro a cultivar este andar santo porque ele, o Senhor, é santo. E isso é marcante em tudo que devem fazer, seja no âmbito familiar e nacional, no trabalho e descanso, nas festas e celebrações.

O contraste com toda instrução para pureza e chamado para santidade é observar o cenário em que nós estamos em pleno século XXI, o qual se fala tanto sobre progressos e avanços para humanidade. Em uma era tão complexa, perdemos a simplicidade da vida. As coisas básicas que envolvem pessoas, os animais e a natureza são atualmente fonte de preocupação pelo nosso descuido e irreverência. As festas não são momentos de celebração de uma alegria perene e duradoura de um povo que deveria se unir como um só, mas são regidas pelo prazer, descartabilidade, superficialidades e ressacas que revelam o vazio interior na manhã seguinte. Alguns de nossos marcos históricos – como, por exemplo, Natal e Páscoa – tornaram-se fonte de renda para uma sociedade de consumo e inescrupulosa que produz produtos e mais produtos sem o cuidado com o planeta, esvaziando o bolso de multidões sem preencher significativamente os tais consumidores com algo existencialmente relevante. E o que falar do sábado? O conceito sabático marcado por reverência é negociado diante de um mundo irreverente que não pára, não perdoa, não depende, não descansa, não celebra. Mal conseguimos lidar com a idéia de descanso semanal, quanto mais mensal, anual ou secular.

A disparidade entre a proposta de Levitico e a nossa prática urbana contemporânea é, no mínimo, digna de reflexão. O que, de fato, as festas e baladas que participamos trazem: euforia momentânea e superficial, ou alegria transformadora? Será que os caminhos escolhidos por nós até aqui estão, de fato, trazendo mais vida para nós, para as pessoas que nos cercam, para nossos filhos que ficarão e para nosso planeta que anuncia mudanças? E os dias “sabáticos” que temos, de fato, preenchem nossa alma, trazendo descanso, paz e serenidade em devoção contemplativa ou são apenas momentos de recuperar o fôlego para voltar o trabalho que urge em ser realizado?

Talvez, em meio aos questionamentos e ponderações, possamos encontrar alguns dos motivos que fazem o nosso mundo ser o que é. A independência pós-moderna impossibilita a manifestação de um Deus que nos convida a depender. A irresponsabilidade urbana em meio a uma economia agressiva corrói um planeta que grita por socorro e entristece o Deus que nos convida à harmonia e ao equilíbrio. A irreverência em nossa vida de momentos e prazeres pontuais e egoístas comprometem nossa jornada de amadurecimento e com um propósito de existência. Nossa geração caminha para ser a conhecida como geração omissa, destituída de líderes e desprovida de sentido. Será que o caminho proposto da santificação em Deus é tão impróprio assim? E nem me refiro aos aspectos literais da lei, mas à essência presente nos princípios por trás dela. Será que eles não nos levarão a um lugar melhor como pessoas e povos espalhados pela Terra?

Pense. Reflita. Aja. É tempo de mudar. E isso pode começar comigo e com você. Começa olhando para Deus e acolhendo sua instrução. Uma instrução que envolve crescimento e maturidade. Uma orientação que almeja a pureza. Uma direção que promove a santificação. Somos chamados para sermos santos. Cabe a cada um de nós atender o chamado. Depende de cada um de nós deixar marcas em um mundo que caminha para o caos e destruição.

Um comentário:

Unknown disse...

Ola Daniel,
Li seu post sobre o livro de leviticos e achei bastante interessante!
Deus te abencoe.
Paulinha Martins